segunda-feira, fevereiro 28, 2011

USOS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE


Celebremente, Pierre Bourdieu iniciou uma Conferência na Universidade de Todai[1], assim: “Se eu fosse japonês, acho que não gostaria da maior parte das coisas que os não japoneses escrevem sobre o Japão” (Bourdieu, 2005, p.13). Tomando como ponto de partida a expressão de Bourdieu e num âmbito microssocial, é necessário pensar a concepção do termo Universidade partindo de dentro da própria universidade. Novamente, tomam-se como referência as palavras de Bourdieu para justificar a importância da reflexão aqui proposta e,

“Espera-se assim mostrar que os lugares ditos “difíceis” (como hoje o conjunto habitacional ou a escola) são primeiramente, difíceis de escrever e de pensar[2] e que é preciso substituir as imagens simplistas e unilaterais (...) por uma representação complexa e múltipla, (...) fundada na expressão das mesmas realidades em discursos diferentes, às vezes inconciliáveis; e (...) abandonar o ponto de vista único, central, dominante (...) em proveito da pluralidade de suas perspectivas correspondendo à pluralidade dos pontos de vista coexistentes e às vezes diretamente concorrentes.” (Bourdieu, 1997, p. 11-12)[3]

É necessário ver o que existe de fato e a forma como as relações são estruturadas. É necessário expor as particularidades com o intuito de capturar a lógica mais profunda impressa em uma realidade empírica. O espaço social é o espaço habitado com símbolos, distâncias sociais e diferenças retraduzidas na forma do poder sejam capital, cultural, social, econômica ou cientifica. O espaço social estrutura-se conforme a disposição dos agentes no espaço físico de acordo com as suas posições relativas como: localizações temporárias, permanentes, através das propriedades e da demonstração de poder de consumo.

A estruturação espacial estrutura também o formato e a proximidade das relações se partirmos do pressuposto de Bourdieu de que a distância espacial reflete na distância social. O espaço social é reflexo da construção coletiva do espaço físico através da atribuição de sentido e de simbolismo “(...) o espaço é um dos lugares onde o poder se afirma e se exerce, e, sem dúvida sob a forma mais sutil, a da violência simbólica como violência desapercebida...” (Bourdieu, 1997, p.163). Para Bourdieu o espaço social “(...) é construído de tal maneira que, quanto mais próximos estiverem os grupos ou instituições ali situados, mais propriedades eles terão em comum (...) as pessoas próximas no espaço social tendem a se encontrar próximas por opção ou por força...” (BOURDIEU, 1990, p. 153)[4].

O campo social da universidade é um espaço múltiplo de pontos de vista e de ações que como explicita Bourdieu podem ser concorrentes em determinados momentos. A partir da concepção do que é o espaço social partimos para a compreensão do termo Universidade. A multiplicidade de pontos de vista acerca das funções da Universidade, das suas responsabilidades bem como da sua autonomia é um assunto comum no meio acadêmico e no meio docente. Para tanto, a inquietação acerca dos usos da Universidade Pública não é um assunto inovador uma vez que, teóricos como Max Weber[5], Pierre Bourdieu[6] e Boaventura de Sousa Santos[7] já demonstraram as suas preocupações com os rumos das instituições públicas de ensino superior, em seus escritos. Tais questões ganharam maiores proporções no seio da sociedade tendo em vista a rápida expansão nas últimas décadas das unidades de ensino superior privadas.

A universidade é um microcosmo dotado de suas próprias leis e o seu mundo social é relativamente independente das pressões sociais do mundo global que a envolve. Este espaço é múltiplo no que tange às abordagens e perspectivas uma vez que contempla várias áreas do conhecimento. A multiplicidade de pontos de vista enfatizada por Bourdieu[8] direciona as análises para as funções latentes e manifestas dos papéis da Universidade Pública, estas funções estão implícitas nas três dimensões: ensino, pesquisa e extensão, um triângulo que atende às diversas atribuições da universidade. O ensino está direcionado para as práticas docentes e laborais pertinentes à docência, a pesquisa é de interesse coletivo, uma vez que é nas universidades que se concentram os estudos tecnológicos e científicos que compreendem pesquisas das ciências humanas, biológicas, sociais e exatas, e, finalmente, a extensão que contempla a sociedade através de projetos que permitem que os indivíduos e movimentos sociais tenham acesso ao espaço da produção do conhecimento.

A lógica da universidade pública está “... inscrita na lógica universalista de uma instituição estatal consagrada e dedicada ao serviço público e ao interesse geral” (BOURDIEU, 2004, p.59). A função social da universidade é contribuir cientificamente de forma positiva para resolução de problemas que chegaram à consciência pública.

Autonomia destinada ao espaço da universidade é sinônimo de mais liberdade para investigar e posicionar-se criticamente frente às demandas sociais e tecnológicas, além de favorecer a possibilidade de investimentos a médio e longo prazo para investigações complexas sem muita demanda do mercado ou da sociedade. A comercialização do conhecimento, ou a mercantilização do ensino é apenas o lado mais visível da relação conhecimento-sociedade. Ao longo do século XX os problemas a serem resolvidos eram definidos pelos pesquisadores, todavia, para Santos durante a última década foi iniciado um processo de mudança no que tange à relação conhecimento-sociedade.

Santos propõe em seu livro a Universidade no século XXI, que a ciência tenha um uso alternativo através da ecologia dos saberes visando trazer saberes não universitários para dentro da universidade. A Ecologia dos Saberes é o confronto entre teoria e prática, é o diálogo com outros tipos de saberes localizados fora dos muros da universidade. Consiste de certo modo, em uma dialética do conhecimento, a racionalização do mundo e a tentativa filosófica de relativização conduzem a ciência para o reencontro com o senso comum.

“Ecologia dos saberes é, por assim dizer, uma forma de extensão ao contrário, de fora da universidade para dentro da universidade”. (SANTOS, 2004, p.76) A reorientação para a valorização dos saberes leigos contribui para reintegrar outros tipos de saberes na produção do conhecimento, uma vez que, estes foram excluídos do cenário do conhecimento no período da racionalização da ciência. A Ecologia dos Saberes é a reorientação solidária da relação universidade-sociedade.

A Universidade Pública em suas ações tem a função de responder à sociedade questões que lhes foram confiadas, mas, para Bourdieu as demandas da sociedade para universidade variam conforme o capital cultural da população questionadora. O movimento universidade – sociedade encontra-se em expansão, entretanto, as cobranças da sociedade para com a universidade, talvez ainda seja tímida.

No que tange às demandas dos movimentos sociais Bourdieu atenta que estas ainda são poucas, exceto, o caso dos movimentos ecológicos e atenta que o nível de inovação das demandas variam conforme o nível de instrução. As demais demandas ainda estão presas às imposições midiáticas que, determinam quais problemas devem ser investigados e quais os “ditos” problemas sociais.



[1] BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 2005.

[2] Grifo do autor

[3] BOUDIEU, Pierre (coord). A Miséria do Mundo. Petrópolis: Vozes, 1997

[4] BOURDIEU, Pierre. Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990.

[5] WEBER, Max. A ciência como vocação. Disponível em: http://www.lusosofia.net/textos/weber_a_ciencia_como_vocacao.pdf, acesso em: 10/03/2008.

[6] BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clinica do campo cientifico. São Paulo:UNESP,2004.

[7] SANTOS, Boaventura de Souza. A Universidade no século XXI: para uma reforma democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo:Cortez, 2004.

[8] BOURDIEU, Pierre. O espaço dos pontos de vista. In BOURDIEU, Pierre (coord.). A miséria do mundo. Petropolis: Vozes, 1997.

Qual o nível do ensino de arquitetura no Brasil? A estrutura curricular deve ser revista? Quais os pontos que deveriam ser mais fortes?

COLABOROU GIOVANNY GEROLLA

Formar um arquiteto e urbanista não significa apenas oferecer um pacote-padrão de disciplinas durante quatro ou cinco anos de faculdade. O conteúdo transmitido nas salas de aula deve estar em sintonia com as novas necessidades da sociedade. Mas os recém-egressos de nossas faculdades estão preparados para atender a essas demandas? As centenas de escolas de arquitetura oferecem uma formação adequada a seus estudantes? Como ocorre com os advogados, deveria haver uma seleção dos profissionais mais capacitados a exercer a profissão de arquiteto e urbanista? Confira as respostas dos profissionais consultados por AU.

fotos acervo pessoal
Andrey Rosenthal Schlee, diretor da FAUUNB
Há, ao mesmo tempo, cursos excelentes, que formam profissionais capacitados e habilitados para atuar, e outros cursos desqualificados, ou professores despreparados, ou ainda estudantes desinteressados. O crescimento do número de instituições públicas e privadas que atuam no ensino profissionalizante é enorme, mas o País também é. E maiores ainda são os nossos desafios. Num país tipicamente urbano, o arquiteto urbanista é cada vez mais fundamental. O importante, no entanto, é formar profissionais interessados em resolver os problemas do Brasil de hoje - e não mais continuar apostando numa formação descontextualizada, elitista e moldada nos termos da academia francesa do século 17. Precisamos urgentemente de planejadores urbanos, e apesar de já termos diretrizes curriculares e padrões de qualidade definidos para o ensino da arquitetura, ainda é preciso rever o perfil profissional que cada escola quer ou deve colocar no mercado - principalmente as públicas.

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Francisco Segnini Junior, coordenador da Comissão de Coordenação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da USP (Cocau)
O MEC, por meio das Diretrizes Curriculares, tem tentado garantir que os conteúdos básicos estejam presentes em todos os cursos de arquitetura e urbanismo do País. Entretanto, o que se observa é que nem sempre a aplicação dessas diretrizes se faz adequadamente. O rápido crescimento do número de cursos (hoje existem 215 cursos registrados) se dá, principalmente, por meio do ensino superior privado. Entre eles, a maioria é ministrada no período noturno, mas estruturada à semelhança dos cursos diurnos ou em tempo integral. Tal situação tem provocado distorções no processo de ensino e aprendizagem, permitindo que profissionais com preparo insuficiente detenham qualificações para o exercício da profissão. Eles tendem a representar riscos à sociedade. Além disso, a carga horária destinada às disciplinas técnicas tem diminuído. Arquitetura é projeto e construção. É necessário que as escolas retomem e aprofundem o ensino da tecnologia - esta, cada vez mais complexa e variada.

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Lucas Faulhaber, diretor geral da Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo (Fenea)
Não se trata somente de um problema de ensino. Infelizmente, outros alicerces da nossa universidade, como pesquisa e extensão, são ainda mais sucateados - quando existem. As Diretrizes Curriculares vigentes até corresponderiam a uma formação de boa qualidade, mas o MEC não vem sendo capaz de exigir sua implementação nas faculdades, em grande parte por termos um sistema deficiente de avaliação do ensino superior. Defendo um currículo ainda mais voltado para a nossa realidade social, para que a universidade possa exercer o seu papel transformador. Nesse sentido, conceituamos e defendemos os escritórios-modelo de arquitetura e urbanismo como uma atividade que pode gerar, ao mesmo tempo, aprendizado prático e um retorno à sociedade.

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José Antonio Lanchoti, arquiteto e urbanista, presidente da Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo
O ensino de arquitetura e urbanismo no Brasil vem se modificando ao longo desta última década, em decorrência da criação das Diretrizes Curriculares, implantadas pela primeira vez em 1994, para substituir o antigo Currículo Mínimo - e suas posteriores alterações. Com essas transformações, tem-se buscado compreender as novas demandas da sociedade de nossa época, respondendo-as com conhecimentos transmitidos aos futuros profissionais, por sua vez, cada vez menos preparados para a vida universitária. O Conselho Nacional de Educação realizou recentemente algumas alterações nessas Diretrizes Curriculares, o que promoveu um retrocesso de antigas conquistas. Agora, cabe reverter o retrocesso: ações sociais da profissão - assistência técnica para habitação de interesse social, questões de preservação ambiental, de defesa do patrimônio construído, de acessibilidade e da ética - serão pontos essenciais.

fotos acervo pessoal
Alvaro Puntoni, professor da FAUUSP e da Escola da Cidade, e arquiteto do escritório Gruposp
Falta a organização de um Colégio de Arquitetos - órgão diferente do Crea -, que determine um sentido social mais amplo para arquitetura e exija exame específico para o exercício da profissão. Esta falta sugere uma estrutura de ensino frágil. Nas escolas, por outro lado, há o excesso de disciplinas autônomas e desconectadas, advindas de reformas do ensino na década de 60. Com as transformações sucessivas, os cursos foram se burocratizando e, infelizmente, hoje nossas escolas se pautam no currículo mínimo, que pressupõe a formação em 3.600 horas (até cinco anos). A Escola da Cidade aprovou em 2009 a matriz curricular de seis anos, mantendo as cinco disciplinas (urbanismo, tecnologia, desenho, história e projeto), o Estúdio Vertical, o programa de viagens de estudo (Escola Itinerante) e os seminários de realidade e cultura contemporânea, além de implantar o estágio assistido e criar a possibilidade de intercâmbio no 100 semestre. O aluno cursará disciplinas optativas e desenvolverá, ao mesmo tempo, seu trabalho final. Aquele que ingressa em uma escola de arquitetura deve ter tempo para construir um envolvimento mais profundo com esse universo. Ser arquiteto é ser construtor de um mundo que conhecemos e de outro que ainda não conhecemos. É importante permitir-se conhecer aquilo que não se sabe.

Sofia Mattos
Siegbert Zanettini, arquiteto e urbanista
O ensino de arquitetura deixa a desejar na maioria das escolas do País. A produção do conhecimento em pesquisa é quase nula. Não são ministradas disciplinas que desenvolvam novas tecnologias, muito menos novas soluções para a estrutura urbana. Tampouco são propostos conhecimentos consolidados em ciências humanas, biológicas, exatas, econômico-administrativas e ambientais (incluindo ecoeficiência e sustentabilidade). Professores de projeto, em sua maioria, não exercem a atividade e não têm experiência gerencial em execução de obras. Por último, as escolas deveriam ser mais bem equipadas com bibliotecas, ateliês e, principalmente, ferramentas atuais de informática.


FONTE: Revista Arquitetura e Urbanismo. Disponível em:

http://revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/202/artigo206884-1.asp

sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Por uma academia ética.

Olhar pela janela, das experiências vividas impõe certo ritmo à vida. Por vezes de resignação, por outras de inquietação e questionamentos culminando muitas vezes na fatídica constatação de que o respeito e o altruísmo estão na outra margem do lago...

É estranho resignar-se diante do preconceito e da prepotência, tratados por alguns como uma medalha de honra ao mérito... Tenho sim meus preconceitos e procuro mantê-los guardados a sete chaves... Será hipocrisia? Acredito que não, e acredito que preconceitos devem ser vencidos e superados, ou pelo menos podados para não ferirem as pessoas.

Acho engraçado... Algumas pessoas ditas entendidas de arte, sequer entendem de cultura, de diversidade cultural e buscam a todo custo impor as suas concepções pessoais para uma vasta multidão. Estas situações me fazem pensar que, embora, novamente em uma cadeira acadêmica muitos preceitos e ideais permanecem arraigados no meu posicionamento. Sejam preceitos sociológicos, políticos ou antropológicos que fazem sentir saudades do respeito à diversidade, formas de expressão, da ética e do amor pela ciência acadêmica...

A academia é um lugar para formação de profissionais éticos que de alguma forma vão trabalhar para a sociedade seja na construção de edifícios, na elaboração de projetos, no desenvolvimento da tecnologia, seja lecionando ou lidando com pacientes terminais. O que alguns profissionais mesquinhos esquecem é que a sociedade precede as profissões. A cultura não é privilégio de poucos. Uma vez que ela está arraigada seja em aspectos globais ou regionais.

Diante da mesquinhez e da visão unilateral do que é cultura, e das concepções de gosto e de escolhas recordo-me de Weber e do seu texto “A ciência como vocação”, que a meu ver deveria ser obrigatório para professores e ditos professores.

Num auditório, deve o professor falar diante dos seus ouvintes, e estes guardar silêncio; os estudantes, em vista da sua progressão, estão obrigados a frequentar as aulas de um professor e nelas não é permitido fazer críticas. Considero, pois, uma irresponsabilidade que o docente aproveite esta circunstância para estampar nos ouvintes as suas próprias ideias políticas, em vez de se limitar a cumprir a sua tarefa: ser útil com os seus conhecimentos e com as suas experiências científica. Sem dúvida, é possível que um indivíduo só em parte consiga excluir as suas simpatias subjectivas. Expõe-se então à mais viva crítica no foro da sua consciência. Mas isto nada prova, pois também são possíveis outros erros puramente objectivos, e todavia nada demonstram contra o dever de buscar a verdade. A minha recusa parte também, e tão só, do interesse cientifíco. Apoiando-me nas obras dos nossos historiadores, pretendo mostrar o seguinte: sempre que o homem de ciência surge com o seu próprio juízo de valor, cessa a plena compreensão dos factos. No entanto, esta questão ultrapassa em grande parte o tema do serão de hoje e exigiria longas discussões. (WEBER, Max. A ciência como vocação.)[1]

Olhar através da janela faz-me retomar aos meus preceitos natos da concepção do que é a academia, do que é o conhecimento, do que é cultura, e por fim do esquecimento da tarefa angular do educador: ser útil com os seus conhecimentos e com as suas experiências cientificas. O trágico em tudo isso, é que se esquecem das consequências - sempre que o homem de ciência surge com o seu próprio juízo de valor, cessa a plena compreensão dos factos.

Gostaria mesmo é de não estar olhando pela janela, mas apedrejando-a para que as luzes da ética, do respeito e do bom senso pudessem entrar... Mas, por enquanto fico a olhar pela janela de forma resignada...


[1] WEBER, Max. A ciência como vocação. Disponível em: http://www.lusosofia.net/textos/weber_a_ciencia_como_vocacao.pdf . Acesso em:25/02/2011

quinta-feira, novembro 11, 2010

PAULO MENDES DA ROCHA



1. INTRODUÇÃO

A formação das cidades pode ser vista por diversos ângulos, um deles como consequência da necessidade dos homens de se relacionarem. A cidade é um ambiente dinâmico e, muitas vezes contraditório.
O crescimento exacerbado dos centros urbanos e a ausência de planejamento urbano configuraram cidades com necessidades de adaptações e intervenções urba
nísticas e arquitetônicas. Estas intervenções apresentam aspectos positivos quando são observadas e respeitadas as potencialidades do local bem como a significação simbólica atribuída ao espaço.
A cidade funciona como um organismo vivo e impõe a necessidade de intervenções que dinamizem o cotidiano e não sejam meras consequências do embelezamento estético, mas que atenda as necessidades sociais dos habitantes do projeto.
Diante dessas premissas e de entender que a arquitetura é a responsável pela construção das cidades e de esta ser portadora de sua própria racionalidade apresenta-se o arquiteto Paulo Archias Mendes da Rocha ganhador do prêmio Pritzer 2006. Paulo Mendes da Rocha preocupa-se com o projeto em si, bem como com os habitantes do projeto e com a sociedade como um todo. Qualidades que lhe renderam o prêmio Pritzker, o Nobel da arquitetura em 2006, antes concedido somente a Oscar Niemeyer, em 1988.
A escolha de Mendes da Rocha foi justificada pelo júri pelo uso de materiais de concreto e métodos de construção inteligentes e notavelmente diretos. Salientaram também que o trabalho do arquiteto sempre foi pautado no senso de responsabilidade tanto pelos habitantes do projeto quanto pelas necessidades da sociedade como um todo. (FOLHA, 2006) .
A justificativa do júri pauta-se na característica humanística do arquiteto, na sua preocupação em atender as necessidades sociais e estéticas do projeto, valorizando também a sua preocupação em harmonizar arquitetura e natureza.
A essência de Paulo Archias Mendes da Rocha está diretamente relacionada ao seu posicionamento em relação à arquitetura e à função do arquiteto diante da sociedade e das suas atribuições profissionais.
O reconhecimento da arquitetura como dinâmica e com poder transformador, permite ao arquiteto se deslumbrar e modificar a natureza, sem deixar de respeitar a geografia, tornando-a um espaço habitável.
Em suas obras tem como temas recorrentes: o território, a técnica e a cidade. O território é visto como cerne da elaboração de um projeto, que tem como função humanizar a natureza. A técnica é tratada respeitosamente pelo arquiteto como uma forma de viabilizar e transformar a existência humana. A cidade é tida como um centro cultural, como um cenário permeado de dinamismos e contradições.
Ao apresentar o livro “Paulo Mendes da Rocha” organizado por Rosa Artigas, Edemar Cid Ferreira, sintetiza o arquiteto: “Quando desenha uma casa, Paulo Mendes da Rocha é urbanista; quando restaura um edifício, é crítico de arte; quando discute os problemas da cidade, revela-se um agudo cientista social” (ARTIGAS, 2002, p. 8).


2. BREVE RELATO BIOGRÁFICO

De origem capixaba, nasceu em 1928 em Vitória, capital do estado. Entretanto, Mendes da Rocha carrega consigo um pouco do Rio de Janeiro, terra da sua infância e de São Paulo da sua juventude até os dias de hoje, onde mantém residência e escritório.
Paulo Mendes da Rocha pode ser considerado um mito da arquitetura brasileira, uma vez que ganhou os dois principais prêmios internacionais de arquitetura: o Mies van der Rohe e o Pritzker.
Sua biografia é marcada pela influência do seu pai Paulo Menezes Mendes da Rocha, engenheiro e diretor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, o que favoreceu a sua reflexão sobre a relação da natureza com a engenharia.
Mendes da Rocha foi convidado em 1959 para lecionar na Universidade de São Paulo, onde permaneceu até 1998 como professor. Um dos marcos da sua carreira foi a cassação dos seus direitos políticos , sendo proibido de lecionar retornando, apenas, em 1980 com a anistia. Tornou-se professor titular em 1998 e foi aposentado compulsoriamente pela idade, 70 anos.
O arquiteto atuou também como representante de classe, como presidente do departamen
to paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil - IAB/SP em duas ocasiões: 1972-1973 e 1986-1987. A trajetória do arquiteto Paulo Mendes da Rocha mostra o seu comprometimento com a Arquitetura e também como cidadão. A cassação dos direitos políticos é reflexo da sua responsabilidade social e da sua consciência da importância da arquitetura como um dos agentes de transformação do espaço, da cidade e das relações sociais.
Mendes da Rocha destacou-se academicamente muito cedo, ao vencer o concurso para projetar o Ginásio do Clube Atlético Paulistano. Aos 29 anos a obra lhe rendeu o Grande Prêmio da Presidência da República na 6ª Bienal de São Paulo, em 1961.
De competência inquestionável e comprovada por meio de obras realizadas por meio de concursos públicos como : Palácio Legislativo do Estado de Santa Catarina, Ginásio de Esportes e remodelação para o Clube Atlético Paulistano, Sede do Jóquei Clube do Estado de Goías, Pavilhao do Brasil na Feira Internacional Expo Osaka 70 e Museu Brasileiro de Escultura (MUBE). O projeto de restauração da Pinacoteca do Estado de São Paulo lhe rendeu o II Premio Mies Van der Rohe de Arquitetura Latino-Americana.
Quadro 1. Principais Obras do Arquiteto
1957 Ginásio do Clube Atlético Paulistano, São Paulo
1969 Pavilhão brasileiro da Feira Internacional de Osaka, Japão, juntamente com Flávio Motta, Júlio Katinsky e Ruy Ohtake, demolido.
1963 Estádio Serra Dourada em Goiânia
1975 Museu de Arte Contemporânea da USP (com Jorge Wilheim), São Paulo, não construído
1986 Museu Brasileiro da Escultura (MUBE), São Paulo
1987 Capela de São Pedro Apóstolo, construção anexa ao Palácio Boa Vista, Campos do Jordão
1989 Museu de Arte de Campinas
1989 Casa Gerassi
1988/1999 - Reforma da Pinacoteca do Estado de São Paulo
-1996/1998 - Reforma do Centro Cultural da FIESP, São Paulo, com a colaboração dos escritórios MMBB e SPBR.
1998 Edifício do serviço estadual Poupatempo no bairro de Itaquera, em São Paulo, juntamente com o escritório MMBB.
2002 Projeto para uma cobertura sobre a Galeria Prestes Maia, na Praça do Patriarca em São Paulo
2004 Plano Diretor para ampliação e reorganização do campus da Universidade de Vigo, Espanha, com o escritório MMBB.

2006 Intervenção e reforma da Estação da Luz, em São Paulo e projeto do Museu da Língua Portuguesa naquele local
2008 Novas instalações do Museu Nacional dos Coches nos terrenos das antigas Oficinas Gerais do Exército, na zona de Belém, em Lisboa.


3. A DIFÍCIL ESCOLHA DE UMA OBRA

Paulo Mendes da Rocha possui uma vasta produção arquitetônica com aspectos singulares, o MuBE, a Loja Forma, Centro Cultural da FIESP, Museu da Língua Portuguesa, dentre tantos outros. Entretanto a obra escolhida foi a Praça do Patriarca, localizada no centro da cidade de São Paulo. A obra permite deslumbrar a completude do profissional como urbanista, crítico de arte e cientista social. E nessa alusão aos comentários de Edemar Cid Ferreira é possível acrescentar o poeta da cidade.
Dentre as obras de Mendes da Rocha o Pórtico do Patriarca foi escolhido pela possibilidade de integração do transeunte com a obra de arte. Sem contar com a perspectiva do arquiteto de pensar a obra de forma integrada e a valorização da possibilidade de socialização das pessoas em meio a uma praça. O arquiteto preservou características históricas, como a manutenção e recuperação do piso de mosaico português e demonstrou a preocupação com a conservação cultural daquele espaço, bem como com a sua integração com a proposta moderna.
É isso!!! A obra de Mendes da Rocha quando esmiuçada permite perceber mais que um simples monumento, mas uma escultura permeada de símbolos e significados.


3.1. Praça do Patriarca
Em meio à história quinhentista da cidade de São Paulo a Praça do Patriarca José Bonifácio de Andrada e Silva, é recente. A origem da praça se deu a partir da necessidade de abrir passagem para a Rua Líbero Badaró e para o Viaduto do Chá, em meados dos anos 1940 e 50.


FOTO 1. Praça do Patriarca em 1925, recém-inaugurada. A esquerda, o edifício da Mappin Stores.
FONTE: Prefeitura de São Paulo
FOTO 2. Praça do Patriarca anos 1930.
Fonte: Museu Virtual dos Transportes Urbanos

O crescimento e o dinamismo das cidades implicam em mudanças e adaptações do uso do espaço. Sendo assim revitalizações e intervenções se fazem necessárias para melhor utilização e otimização do espaço.
No caso da Praça do Patriarca não foi diferente, tornando-se necessária a sua revitalização. O projeto de revitalização da Praça era um sonho antigo, datado dos meados da década de 1990 e como parte de uma proposta mais ampla do Viva Centro para a revitalização do centro de São Paulo o projeto de Paulo Mendes da Rocha foi elaborado no ano de 1992, e executado em 2002, conforme consta no site da instituição.

3.2.A revitalização de um espaço público

A proposta explícita na memória descritiva do projeto contém características singulares do pensamento do arquiteto diante da necessidade de revitalizar um espaço público, bem como de não isolá-lo em meio ao contexto em que se insere. Para o arquiteto era necessário “Não simplesmente restaurar, também criar novos desenhos que abriguem, amparecem e expressem hábitos, símbolos urbanos contemporâneos, do tempo que vivemos.”
Aqui, na Praça do Patriarca, é indispensável a retirada dos ônibus e a partir daí, reformar o arranjo do espaço com atenção particular para os seguintes aspectos deste Projeto:
1 – Uma penetração do leito carroçável para breves estacionamentos, ponto de táxis, serviços da igreja e dos hotéis, para uso da própria Galeria Prestes Maia e ônibus turísticos ao longo da Líbero Badaró. Uma modalidade domesticada entre automóvel e pedestre. Que chegue um carro junto ao limite da Rua São Bento, boca da Rua da Quitanda, da Rua Direita, tradicional centro Bancário e Jurídico.
2 – Uma implantação intrigante, estratégica – ao longo do eixo do Viaduto – para o Ceschiatti Belíssimo com sua casaca barroca.
3 – Uma restauração oportuna dos desenhos nos mosaicos do piso, imperfeita...
4 – A substituição da Cobertura para o acesso da Galeria Prestes Maia. Que seria a peça mais importante do conjunto e que realiza a Praça.
Neste artefato arquitetônico deve-se tentar falar da contradição das escalas da “cidade velha” com a paisagem do Vale do Anhangabaú, principalmente em relação ao leito do Viaduto, uma extensão do mesmo piso da Praça no vazio, um passeio sob o amplo céu aberto.
Tanto para o abrigo das escadarias, com para o conjunto da situação toda, imaginamos uma cobertura suspensa, que não toca o chão, mostrando para o pedestre a pequena praça inteira e uma arquitrave que a sustenta pendurada, constituindo um portal para aquela parte da cidade, na qual se vai entrar. Por ali, n’aquele lugar. E, no sentido contrário, uma moldura de aviso para passar aos espaços abertos, para as visuais sobre o outro lado da cidade.
Esta estrutura se resolve com formas adequadas, leves e um tanto de aparência instável, convocando sensações imprevistas.
Estrutura metálica, de aço, de acordo com os desenhos, modelo, fotografias do modelo e cálculos estruturais preliminares que acompanham esta memória. De fácil execução com tecnologia perfeitamente dominada pela nossa engenharia. A cor deverá ser clara, branca*. O peso total do conjunto está estimado em 88 toneladas, muito cômoco.
5 – Iluminação nova, com refletores dirigidos para a Igreja e os edifícios restaurados. Uma iluminação própria da cobertura suspensa, irradiante da superfície branca, como o lugar.
(ROCHA, Paulo Mendes da. Memória descritiva do Projeto Patriarca)

A obra atendeu à proposta do arquiteto. E mais, manteve aspectos originais como a recuperação dos arabescos portugueses do piso.

FOTO 3. Croqui inicial da obra. (Elaborada pelo arquiteto)
FONTE: PINON, 2002.

FOTO 4. Localização da Praça no entorno.
FONTE: VILLAC, 2002.

3.3. Um novo elemento para a Praça

A construção do Pórtico branco, em meio à praça em estrutura metálica dá a ideia de mudança, de passagem do centro velho para o centro moderno de forma integrada. O Pórtico é formado por uma cobertura curva de 20 m x 25 m, uma viga triangular, com formato de estrela de três pontas, também tem função de calha. O vão do pórtico possui 40 m e está apoiado sobre dois pilares. As chapas de aço utilizadas para o recobrimento possuem 3 e 4,5 mm de espessura para a mesa superior e, 6 mm para a mesa inferior .
FOTO 5: Praça do Patriarca, São Paulo - SP

4. ANÁLISE ICONOGRÁFICA DA OBRA


PÓRTICO: “Varandas, pórticos e marquises se projetam a partir do volume principal de um edifício a fim de propiciar abrigo, receber e anunciar o ponto de entrada.” (CHING, 2005, p.247). Por meio do vazio central, o pórtico gera pontos de referência, entre o centro velho e o centro novo. Além de abarcar a referência simbólica impressa na concepção da praça como local de encontro entre transeuntes. A revitalização da Praça deu uma nova resignificação à utilização do local que havia perdido a essência de espaço público e de encontro.


BASES DE SUSTENTAÇÃO: Formadas por formas geométricas puras como a base triangular e os lados retangulares que dão origem ao sólido geométrico. Segundo Ching “O triângulo significa estabilidade”. (CHING, 2005, p. 40) A escultura tem duas bases verticais com design de um prisma com as extremidades em formato de triângulos. A base horizontal é feita por material maciço e de formas geométricas puras.


COBERTURA: A obra é leve, ágil, de forma sólida e com a transparência necessária para se ver através do tempo, para se ver o novo e o antigo justapostos. Mendes da Rocha revela com esta obra a sua preocupação com as funções do espaço da cidade dando espaço para a manifestação da luz natural.
A cobertura demonstra flexibilidade e de quebra a rigidez do material.


4.1. Conceitos Fortes

BRUTALISMO PAULISTA: A obra destaca as características brutalistas, uma vez que tem a estrutura aparente. Outra característica peculiar é a ausência de ornamentos e maiores rebuscamentos na elaboração do projeto.

LUDICIDADE: A projeção do espaço, da construção da obra tem em si a possibilidade de colocar o homem dentro da obra, de levá-lo para um espaço de transição, assim como é a vida.
LEVEZA: A aparência da obra permite o deslumbramento de leveza, a integração com o espaço circundante além de ser de uma materialidade “única” em meio aos projetos do arquiteto. A obra é leve, ágil, de forma sólida e com a transparência necessária para se ver através do tempo, para se ver o novo e o antigo justapostos. Mendes da Rocha revela com esta obra a sua preocupação com as funções do espaço da cidade dando espaço para a manifestação da luz natural.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto em sua totalidade tem impressa características do arquiteto, embora o material utilizado seja uma inovação do arquiteto. O Pórtico do Patriarca é objeto de integração para os transeuntes, bem como para a paisagem circundante.
É um espaço público que tem o intuito de integrar o centro novo e o centro antigo da cidade, de forma poética e artística. A forma do pórtico assim como os materiais e a cor branca, escolhida pelo arquiteto são sinônimos de aconchego e equilíbrio em meio a uma área urbana.
Mendes da Rocha, ao fazer o uso das formas primárias conseguiu um efeito lúdico, leve e mantendo a sua identidade por meio da estrutura aparente das chapas de metal sem maiores rebuscamentos. Demonstra compreender muito bem a necessidade dos transeuntes de um local de integração além de demonstrar uma sensibilidade exacerbada no que tange aos símbolos e significados.


5. REFERÊNCIAS

ARTIGAS, Rosa. (Org.) Paulo Mendes da Rocha. 2 ed. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
ASCHER, Nelson. Mendes da Rocha leva "Nobel da arquitetura". Folha de São Paulo. São Paulo, 10 abr. 2006. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1004200620.htm . Acesso em 31/10/2010.
CHING, Francis K. Arquitetura , forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
CONSTRUÇÃO METÁLICA. O belo do centro: Pórtico Praça do Patriarca – São Paulo/SP. Construção Metálica. Edição 96/ 2010 .
PINON, Hélio. Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Romano Guerra, 2002.

VILLAC, Maria Isabel. Um novo discurso para a megacidade: renovação urbana da praça do patriarca (1992-2002). Disponível em http://seu2007.saau.iscte.pt/Actas/Actas_SEU2007_files/Maria_Isabel_Villac_4.pdf. Acesso em: 10/1º/2010.


6. ANEXOS


domingo, setembro 19, 2010

O QUE É ARQUITETURA

Joyce Costa Santos[1]

LEMOS, Carlos A. C. O que é Arquitetura. São Paulo: Brasiliense, 2003.

RESUMO: O que é Arquitetura é uma obra que pretende por os acadêmicos de arquitetura em contato com alguns conceitos, bem como traçar aspectos desde a concepção do que é belo até a arquitetura moderna. O autor faz um esforço para apresentar várias correntes, bem como alguns exemplos dos tipos de arquitetura vigente.

O livro “O que é Arquitetura” é uma obra que objetiva colocar o leitor em contato com os primeiros conceitos do mundo acadêmico da arquitetura. A obra foi escrita por Carlos A. C. Lemos, professor, arquiteto e profissional dedicado à arquitetura brasileira e à conservação do patrimônio cultural. Carlos Lemos visa traçar a cronologia do conceito do que é arquitetura, passando pelas noções de construções belas até o conceito de arquitetura moderna.

O livro é estruturado em quatro capítulos curtos. O primeiro capítulo intitulado “A construção bela” retoma aspectos populares do conceito do que é belo. Para Lemos “(...)as pessoas procuram achar vínculo entre a arquitetura e a beleza” (p.7), porém há uma questão inconveniente o que é Belo? Esta questão depende diretamente de aspectos subjetivos de quem define o que é belo. O conceito de beleza é algo subjetivo e está intrínseco ao gosto de quem conceitua. Para se safar das problemáticas epistemológicas Lemos divide as construções em três categorias: as construídas segundo um critério artístico qualquer, erguidas sem desejos de fazer arte e as construções precárias – destituídas de senso estético. Dando destaque especificamente ao segundo aspecto, destacando as obras populares, as resultantes do contato com o colonizador e finalmente a resolução dos problemas por meio da tecnologia.

Lemos ressalta que com a Revolução Industrial houve uma mudança de conceitos e uma nova forma de olhar as coisas, surgindo desta forma uma “arquitetura paralela” à arquitetura acadêmica. A arquitetura paralela, assim como outras áreas do conhecimento, teve influência direta do racionalismo tecnicista decorrente do momento histórico da era iluminista.

O segundo “A arquitetura ao longo do tempo” tem o intuito de traçar uma linha do tempo com as progressos da arquitetura, bem como a inserção de novos conceitos e concepções, tendo como base o legado de Vitrúvio. Destacam-se três aspectos: solidez, utilidade e beleza. Lemos destaca que as concepções de Vitrúvio fazem uma ponte entre o clássico grego e o modernismo.

Ao terceiro capítulo Lemos reserva a discussão para o significado de “Partido Arquitetônico” com título homônimo. É nesse capítulo que Lemos dá o seu conceito do que é Arquitetura, em síntese para o autor: arquitetura é a intervenção no meio ambiente criando novos espaços, quase sempre com intenção plástica. Ou seja, é a alteração do espaço com uma preocupação estética inerente.

O partido arquitetônico tem inúmeras influências como: técnica construtiva, clima, condições físicas e topográficas, programa de necessidades, condições financeiras e legislação regulamentadora. Destacam-se questões ligadas à identidade regional, às subjetividades individuais, condições financeiras e aspectos da personalidade. O autor destaca também a mudança nos usos da moradia no decorrer do tempo, bem como as adaptações realizadas em materiais e técnicas ao longo do tempo. Outro aspecto que influencia diretamente no partido arquitetônico são as normas e regulamentações que controlam as edificações e o uso do solo urbano.

O último capítulo, Lemos reserva para discorrer acerca da “Arquitetura Moderna” . Entretanto, dedica-se muito mais a discorrer sobre as dificuldades de ter acesso à materiais característicos da arquitetura moderna do que a expor maiores detalhes acerca da temática. Como exemplos de arquitetura moderna Lemos cita a presença delas em órgãos públicos e grandes centros privados. No que tange às conclusões, o mesmo não as apresenta, ou pelo menos não as deixam explícitas, deixando o leitor na expectativa de algo mais.

A obra de Carlos Lemos é uma obra introdutória para os acadêmicos dos cursos de Arquitetura, refaz o caminho desde os primórdios até a arquitetura moderna. Contudo, não se pode negligenciar que o texto não segue uma ordem cronológica clara retornando inúmeras vezes ao passado. Outro fator que dificulta a leitura da obra é a ausência de continuidade textual bem como algumas lacunas deixadas pelo autor por meio dos conceitos soltos e sem explicação.



[1] Mestre em Desenvolvimento Social, bacharel em Ciências Sociais e acadêmica do 1º período do curso de Arquitetura.

segunda-feira, agosto 30, 2010

Resenha Crítica

CONCEITO E FINALIDADE

Lakatos e Marconi (1996, p. 90) afirmam que:

Resenha é uma descrição minuciosa que compreende certo número de fatos. Resenha crítica é a apresentação do conteúdo de uma obra. Consiste na leitura, no resumo, na crítica e na formulação de um conceito de valor do livro feito pelo resenhista.

A resenha crítica, em geral é elaborada por um cientista que, além do conhecimento sobre o assunto, tem capacidade de juízo crítico. Também pode ser realizada por estudantes; nesse caso, como um exercício de compreensão e crítica.

A finalidade de uma resenha é informar o leitor, de maneira objetiva e cortês, sobre o assunto tratado no livro ou artigo, evidenciando a contribuição do autor: novas abordagens, novos conhecimentos, novas teorias. A resenha visa, portanto, a apresentar uma síntese das idéias fundamentais da obra.

O resenhista deve resumir o assunto e apontar as falhas e os erros de informação encontrados, sem entrar em muitos pormenores e, ao mesmo tempo, tecer elogios aos méritos da obra, desde que sinceros e ponderados. Entretanto, mesmo que o resenhista tenha competência na matéria, isso não lhe dá o direito de fazer juízo de valor ou deturpar o pensamento do autor.

Requisitos Básicos para elaboração de uma resenha crítica:

“conhecimento completo da obra;

competência na matéria;

capacidade de juízo de valor;

independência de juízo;

correção e urbanidade;

fidelidade ao pensamento do autor”.

Importância da Resenha

No campo da comunicação técnica e científica, a resenha é de grande utilidade, porque facilita o trabalho do profissional ao trazer um breve comentário sobre a obra e uma avaliação da mesma. A informação dada ajuda na decisão da leitura ou não do livro.

A resenha, segundo BARRASS (1979:139), deve responder a uma série de questões. Entre elas figuram:

assunto, características, abordagens;

conhecimentos anteriores, direcionamentos;

acessível, interessante, agradável;

útil, comparável;

disposição correta, ilustrações adequadas.

Estrutura da Resenha

Mesmo não fazendo parte dos trabalhos científicos de primeiro nível, a resenha crítica apresenta a estrutura descrita abaixo.

Referência Bibliográfica

Autor(es)

Título (subtítulo)

Imprensa (local da edição, editora, data)

Número de páginas

Ilustrações (tabelas, gráficos, fotos, etc.)

Credenciais do Autor

Informações gerais sobre o autor

Autoridade no campo científico

Quem fez o estudo?

Quando? Por quê? Onde?

Conhecimento

Resumo detalhado das idéias principais

De que trata a obra? O que diz?

Possui alguma característica especial?

Como foi abordado o assunto?

Exige conhecimentos prévios para entende-lo?

Conclusão do Autor

O autor faz conclusões? (ou não?)

Onde foram colocadas? (final do livro ou dos capítulos?)

Quais foram?

Quadro de Referências do Autor

Modelo teórico

Que teoria serviu de embasamento?

Qual o método utilizado?

Apreciação

Julgamento da obra:

Como se situa o autor em relação:

às escolas ou correntes científicas, filosóficas, culturais?

às circunstâncias culturais, sociais, econômicas, históricas, etc.?

Mérito da obra:

Qual a contribuição dada?

Idéias verdadeiras, originais, criativas?

Conhecimentos novos, amplos, abordagem diferente?

Estilo:

Conciso, objetivo, simples? Claro, preciso, coerente?

Linguagem correta? Ou o contrário?

Forma:

Lógica, sistematizada?

Há originalidade e equilíbrio na disposição das partes?

Indicação da obra

A quem é dirigida: grande público, especialistas, estudantes?

Prof. waldemar Neto

COMO SE FAZ UMA RESENHA?

1. DEFINIÇÃO

Inicialmente é preciso definir o termo “resenha”. Fazer uma resenha é o mesmo que fazer uma recensão (que significa apreciação breve de um livro ou de um escrito), ou seja, trata-se de resumir de maneira clara e sucinta um livro, artigo ou qualquer tipo de texto científico.

Embora o texto a ser resenhado tenha um/a autor/a, o/o recenseador/a deve ser o/a autor/a do seu trabalho; quer dizer, é preciso manter a identidade de quem escreveu o trabalho que você está analisando, mas é preciso transparecer a sua presença, como voz crítica sobre o texto.

Resenhar significa resumir, sintetizar, destacar os pontos principais de uma obra científica.

Resenhar significa resumir, sintetizar, destacar os pontos principais de uma obra científica.

2. PROCEDIMENTOS

1o Passo - Leitura total da obra a ser resenhada;

2o Passo - leitura pormenorizada, fazendo os destaques da partes mais significativas, que servirão de fio condutor para elaboração do texto da resenha;

3o Passo - elaboração de um esquema com as principais etapas a serem desenvolvidas pela resenha;

4o Passo - construção do texto propriamente dito;

5o Passo - revisão do texto, correção e aprimoramento.

3. NECESSIDADES

Toda resenha deve ser o mais bem identificada possível, daí as seguintes necessidades:

3.1. cabeçalho contendo o nome da instituição de ensino, título da resenha com identificação do texto resenhado, autor/a da resenha, objetivo do trabalho, local e data.

3.2. Texto dissertativo contendo: introdução, corpo principal do texto e conclusão com apreciação crítica.

3.3. Bibliografia.

4. DICAS IMPORTANTES

A recensão deve cumprir um objetivo claro: comunicar ao leitor os aspectos essenciais da obra em questão e situá-lo no assunto da melhor maneira possível. Lembremo-nos de que, no método Descartes, a 1ª regra é a evidência, i.e., o dado inicial, que tem de ser claro, ordenado e distinto, ou seja, o critério cartesiano da verdade é a clareza e a distinção. Em concreto, Descartes parte de uma dúvida universal (metódica), para, entretanto, superá-la criticamente na conquista da verdade.

A forma da resenha, isto é, o texto deve ser claro, inteligível e dinâmico. O/A leitor/a deve ter prazer nesta leitura e deve sentir-se convidado/a à leitura do texto resenhado. Para isso, é imprescindível o uso das normas padrão da língua portuguesa.

Caso haja necessidade de citação do próprio texto resenhado, isso deve ser feito entre aspas e/ou em destaque. Sempre deve haver referência bibliográfica.

Por vezes, é interessante fazer uma pesquisa mais abrangentes sobre o/a autor/a do texto resenhado, sobre o assunto em questão e sobre a situação atual da pesquisa científica sobre o tema. Esses esclarecimentos, quando convenientes, devem abrir a resenha e preparar o comentário sobre o texto em pauta.

5. APRESENTAÇÃO GRÁFICA

Papel A4 (210x297)

Corpo do texto:

margens: superior 3 cm, inferior 2cm, margem direita: 3cm e margem esquerda: 2cm;

caracteres (fontes): “Times New Roman”, tamanho 12;

títulos e subtítulos: no mesmo tamanho, em negrito e/ou sublinhado;

espaçamento: no texto: 1,5 ; na bibliografia: simples.

Bibliografia

Observa-se o seguinte critério de citação, de acordo com os padrões de Normas Técnicas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas):

SOBRENOME, Nome do autor. Título da obra. Subtítulo. Edição. Cidade (local da publicação; quando houver duas cidades, separa-se com barra: /): Editora (quando houver mais de uma editora, separa-se por barra: /), ano da publicação e páginas citadas.

Ex:

BEAINI, Thais Curi. Heidegger: arte como cultivo do inaparente. SP: EDUSP/Nova Stella, 1986.

quarta-feira, agosto 25, 2010

Como elaborar um portfólio


A elaboração do portfolio é um momento de auto-avaliação e reflexão, que permite desenvolver habilidades de avaliar o próprio trabalho e experiências pessoais. É importante ressaltar que todas as informações contidas no portfolio devem ser seguidas de análises e comentários.

  • O portfólio deve conter alguns elementos, como: capa, folha de rosto, dedicatória, agradecimentos, sumário, introdução, desenvolvimento e conclusão. Acompanhando cada um deles. Capa - Deve conter informações como instituição, título, nome completo do autor, local (cidade da instituição) e ano.
  • Folha de rosto - Apresenta os elementos necessários à identificação do trabalho e deve conter nome do autor, nome do professor orientador, título, finalidade do portfolio, local (cidade), data (mês e ano).
  • Dedicatória - Folha opcional, na qual o autor dedica o seu trabalho.
  • Agradecimentos -É opcional, nesta folha são registrados os agradecimentos às pessoas ou instituições que colaboraram na realização do trabalho.
  • Sumário. É a enumeração das divisões e capítulos, na ordem em que encontram-se no trabalho e com indicação da página inicial correspondente.
  • Introdução. É uma justificativa em que o autor explica o que é o trabalho, a importância e a finalidade da elaboração deste documento.
  • Desenvolvimento. Pode ser dividido em três partes: pessoal, acadêmica e profissional.

  1. Desenvolvimento Pessoal - Nesta etapa, é válido compor um perfil. É importante descrever como é a vida pessoal, falar da família, dos amigos, o que gosta de fazer nos fins de semana, personalidade, fatos que foram significativos e expectativas pessoais. Uma outra maneira de traçar o perfil é pedir à família e aos amigos que escrevam relatos ou depoimentos sobre o autor do portfolio. Também pode mencionar a realização de trabalhos voluntários em organizações não-governamentais - ONGs - e instituições de assistência social, pois há uma crescente preocupação por parte das organizações com o envolvimento em programas e projetos sociais.
  2. Desenvolvimento Acadêmico - É importante descrever todas as participações em eventos durante esta fase, como congressos, seminários, cursos, pesquisas desenvolvidas e atividades acadêmicas. Deve expor também as expectativas acadêmicas. Pode-se anexar uma variedade de avaliações de disciplinas que tenha maior grau de afinidade, pois essa variedade de avaliações indica que o autor tem uma visão generalista e amplo conhecimento. Lembre que o portfolio é um documento para desenvolver uma reflexão crítica com relação às próprias experiências e resultados, portanto não deve conter apenas avaliações, certificados de cursos, congressos e seminários, é necessário que se relatem a importância e o que acrescentou à vida acadêmica a participação nessas atividades
  3. Desenvolvimento profissional - Nesta etapa, devem-se relatar as experiências profissionais mais significativas, o que as atividades desempenhadas trouxeram de benefícios e resultados para a organização, as homenagens recebidas, certificados, prêmios e promoção. Apresente as expectativas profissionais, estabelecendo objetivos de curto, médio e longo prazos, planos de desenvolvimento e de carreira.

Considerações Finais. É a parte na qual devem-se fazer as avaliações finais com relação ao processo de construção do portfolio, expor o que acrescentou e a importância da elaboração deste trabalho para os desenvolvimentos pessoal, acadêmico e profissional.

As vidas pessoal, acadêmica e profissional das pessoas estão sempre em constante desenvolvimento, e o portfolio é um documento que revela todas essas mudanças e expectativas. É um documento dinâmico, está sempre num processo de mudanças e aperfeiçoamento, portanto deve ser atualizado com freqüência.

Os portfólios e os processos de ensinagem

O portfolio (do inglês) é uma modalidade de avaliação retirada do campo das artes e que aparece com o objetivo de criar novas formas de avaliação para o desenvolvimento das inteligências artísticas. (ALVES, Leonir Pessate)

O portfólio começou a difundir-se em espaço escolar na década de 90, com ênfase nos Estados Unidos. O portfólio vem sendo evidenciado como um dos mais novos subsídios para uma avaliação dinâmica e eficiente do ensino. O portfólio com variada terminologia distingui-se de acordo com sua intenção, como: porta-fólios, processo-fólios, diários de bordo, dossiê. “Reflete a crença de que os estudantes aprendem melhor, e de uma forma mais integral, a partir de um compromisso com as atividades que acontecem durante um período de tempo significativo e que se constrói sobre conexões naturais com os conhecimentos escolares”. (Kátia Stocco Smole)

A construção dos portfólios, através dos CD ROOMS, caracteriza os Webfólios, que podem guardar toda a história escolar de um indivíduo desde a Educação Básica até a Educação Superior, e servirá como processo de ressignificação de suas aprendizagens e colaboração no processo de avaliação tanto formativa, como somativa dos procedimentos escolares. Esse portfólio construído ao longo da vida acadêmica, pode ser utilizado para ilustrar o desempenho no desenrolar de sua trajetória escolar. O portfólio é usado como ferramenta de acompanhamento, desenvolvimento e qualidade do ensino/aprendizagem. Os conhecimentos são registrados, enfatizando a finalidade, as competências e práticas adquiridas no processo de ensinagem.

No Estágio Supervisionado e na Educação Infantil a utilização do portfólio é feita com a finalidade de documentar ações e reflexões. O portfólio é usado como ferramenta que facilita a ressignificação do processo de ensinagem e aprendizagem ao longo de um momento de ensino. Sua preparação apresenta a propriedade de ponderar sobre a melhoria e qualidade da aprendizagem dos estudantes, e concomitantemente propicia inserir reelaborações de ações indispensáveis para o sucesso do processo de ensinagem.

De acordo com HERNÁNDEZ, Fernando (2000, p.166) o portfólio é : ...” um continente de diferentes tipos de documentos (anotações pessoais, experiências de aula, trabalhos pontuais, controles de aprendizagem, conexões com outros temas fora da escola, representações visuais, etc) que proporciona evidências do conhecimento que foram sendo construídos, as estratégias utilizadas para aprender e a disposição de quem o elabora para continuar aprendendo”.

Portfólios são trabalhos ilustrativos dos alunos. Representam o seu pensamento, sentimento, a sua maneira de agir; as suas competências e habilidades e a maneira como colocou em prática o seu trabalho acadêmico. Essa ferramenta a serviço da educação tem como finalidade primordial proporcionar uma visão integral do conhecimento formal do educando e sua atuação na aprendizagem das diferentes áreas curriculares, assim como o seu desenvolvimento no campo comportamental e sua evolução na área pessoal e educacional.

Os portfólios permitem uma avaliação de cooperação e participação , havendo interação do professor e aluno. Ambos escolhem os trabalhos mais expressivos do educando, através da criticidade e reflexão, estabelecendo padrões em busca da qualidade e assertividade. Há também um processo interdisciplinar com professores de outras áreas , que opinam em relação ao trabalho do aluno, fornecendo opiniões e depoimentos relativos à melhoria e qualidade do ensino/aprendizagem.

Existe uma gama enorme de registros em portfólios, tais como: desenhos; fotos, artes, exposição de documentos; avaliação acadêmica de desempenho; registro de entrevistas; comentários e documentários de eventos musicais, de dança , de canto; lista de livros lidos; registro de leituras; correspondências; atuações gravadas em vídeo e áudio, etc.
Os portfólios são registros produzidos em períodos de aprendizagem, e para isso podemos usar a fotografia como documento desse momento, não como cristalização, mas como comentários abertos, através de uma evolução histórica do acontecimento, completados e avaliados sempre, procurando buscar de maneira metódica e ordenada a melhor atuação do aluno dentro do seu desenvolvimento acadêmico.
Referências:CHAVES, Idália de Sá- Portfólios Reflexivos: estratégias de formação e de supervisão.

Autora: Amelia Hamze
Educadora
Profª UNIFEB/CETEC e FISO - Barretos