quinta-feira, novembro 11, 2010

PAULO MENDES DA ROCHA



1. INTRODUÇÃO

A formação das cidades pode ser vista por diversos ângulos, um deles como consequência da necessidade dos homens de se relacionarem. A cidade é um ambiente dinâmico e, muitas vezes contraditório.
O crescimento exacerbado dos centros urbanos e a ausência de planejamento urbano configuraram cidades com necessidades de adaptações e intervenções urba
nísticas e arquitetônicas. Estas intervenções apresentam aspectos positivos quando são observadas e respeitadas as potencialidades do local bem como a significação simbólica atribuída ao espaço.
A cidade funciona como um organismo vivo e impõe a necessidade de intervenções que dinamizem o cotidiano e não sejam meras consequências do embelezamento estético, mas que atenda as necessidades sociais dos habitantes do projeto.
Diante dessas premissas e de entender que a arquitetura é a responsável pela construção das cidades e de esta ser portadora de sua própria racionalidade apresenta-se o arquiteto Paulo Archias Mendes da Rocha ganhador do prêmio Pritzer 2006. Paulo Mendes da Rocha preocupa-se com o projeto em si, bem como com os habitantes do projeto e com a sociedade como um todo. Qualidades que lhe renderam o prêmio Pritzker, o Nobel da arquitetura em 2006, antes concedido somente a Oscar Niemeyer, em 1988.
A escolha de Mendes da Rocha foi justificada pelo júri pelo uso de materiais de concreto e métodos de construção inteligentes e notavelmente diretos. Salientaram também que o trabalho do arquiteto sempre foi pautado no senso de responsabilidade tanto pelos habitantes do projeto quanto pelas necessidades da sociedade como um todo. (FOLHA, 2006) .
A justificativa do júri pauta-se na característica humanística do arquiteto, na sua preocupação em atender as necessidades sociais e estéticas do projeto, valorizando também a sua preocupação em harmonizar arquitetura e natureza.
A essência de Paulo Archias Mendes da Rocha está diretamente relacionada ao seu posicionamento em relação à arquitetura e à função do arquiteto diante da sociedade e das suas atribuições profissionais.
O reconhecimento da arquitetura como dinâmica e com poder transformador, permite ao arquiteto se deslumbrar e modificar a natureza, sem deixar de respeitar a geografia, tornando-a um espaço habitável.
Em suas obras tem como temas recorrentes: o território, a técnica e a cidade. O território é visto como cerne da elaboração de um projeto, que tem como função humanizar a natureza. A técnica é tratada respeitosamente pelo arquiteto como uma forma de viabilizar e transformar a existência humana. A cidade é tida como um centro cultural, como um cenário permeado de dinamismos e contradições.
Ao apresentar o livro “Paulo Mendes da Rocha” organizado por Rosa Artigas, Edemar Cid Ferreira, sintetiza o arquiteto: “Quando desenha uma casa, Paulo Mendes da Rocha é urbanista; quando restaura um edifício, é crítico de arte; quando discute os problemas da cidade, revela-se um agudo cientista social” (ARTIGAS, 2002, p. 8).


2. BREVE RELATO BIOGRÁFICO

De origem capixaba, nasceu em 1928 em Vitória, capital do estado. Entretanto, Mendes da Rocha carrega consigo um pouco do Rio de Janeiro, terra da sua infância e de São Paulo da sua juventude até os dias de hoje, onde mantém residência e escritório.
Paulo Mendes da Rocha pode ser considerado um mito da arquitetura brasileira, uma vez que ganhou os dois principais prêmios internacionais de arquitetura: o Mies van der Rohe e o Pritzker.
Sua biografia é marcada pela influência do seu pai Paulo Menezes Mendes da Rocha, engenheiro e diretor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, o que favoreceu a sua reflexão sobre a relação da natureza com a engenharia.
Mendes da Rocha foi convidado em 1959 para lecionar na Universidade de São Paulo, onde permaneceu até 1998 como professor. Um dos marcos da sua carreira foi a cassação dos seus direitos políticos , sendo proibido de lecionar retornando, apenas, em 1980 com a anistia. Tornou-se professor titular em 1998 e foi aposentado compulsoriamente pela idade, 70 anos.
O arquiteto atuou também como representante de classe, como presidente do departamen
to paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil - IAB/SP em duas ocasiões: 1972-1973 e 1986-1987. A trajetória do arquiteto Paulo Mendes da Rocha mostra o seu comprometimento com a Arquitetura e também como cidadão. A cassação dos direitos políticos é reflexo da sua responsabilidade social e da sua consciência da importância da arquitetura como um dos agentes de transformação do espaço, da cidade e das relações sociais.
Mendes da Rocha destacou-se academicamente muito cedo, ao vencer o concurso para projetar o Ginásio do Clube Atlético Paulistano. Aos 29 anos a obra lhe rendeu o Grande Prêmio da Presidência da República na 6ª Bienal de São Paulo, em 1961.
De competência inquestionável e comprovada por meio de obras realizadas por meio de concursos públicos como : Palácio Legislativo do Estado de Santa Catarina, Ginásio de Esportes e remodelação para o Clube Atlético Paulistano, Sede do Jóquei Clube do Estado de Goías, Pavilhao do Brasil na Feira Internacional Expo Osaka 70 e Museu Brasileiro de Escultura (MUBE). O projeto de restauração da Pinacoteca do Estado de São Paulo lhe rendeu o II Premio Mies Van der Rohe de Arquitetura Latino-Americana.
Quadro 1. Principais Obras do Arquiteto
1957 Ginásio do Clube Atlético Paulistano, São Paulo
1969 Pavilhão brasileiro da Feira Internacional de Osaka, Japão, juntamente com Flávio Motta, Júlio Katinsky e Ruy Ohtake, demolido.
1963 Estádio Serra Dourada em Goiânia
1975 Museu de Arte Contemporânea da USP (com Jorge Wilheim), São Paulo, não construído
1986 Museu Brasileiro da Escultura (MUBE), São Paulo
1987 Capela de São Pedro Apóstolo, construção anexa ao Palácio Boa Vista, Campos do Jordão
1989 Museu de Arte de Campinas
1989 Casa Gerassi
1988/1999 - Reforma da Pinacoteca do Estado de São Paulo
-1996/1998 - Reforma do Centro Cultural da FIESP, São Paulo, com a colaboração dos escritórios MMBB e SPBR.
1998 Edifício do serviço estadual Poupatempo no bairro de Itaquera, em São Paulo, juntamente com o escritório MMBB.
2002 Projeto para uma cobertura sobre a Galeria Prestes Maia, na Praça do Patriarca em São Paulo
2004 Plano Diretor para ampliação e reorganização do campus da Universidade de Vigo, Espanha, com o escritório MMBB.

2006 Intervenção e reforma da Estação da Luz, em São Paulo e projeto do Museu da Língua Portuguesa naquele local
2008 Novas instalações do Museu Nacional dos Coches nos terrenos das antigas Oficinas Gerais do Exército, na zona de Belém, em Lisboa.


3. A DIFÍCIL ESCOLHA DE UMA OBRA

Paulo Mendes da Rocha possui uma vasta produção arquitetônica com aspectos singulares, o MuBE, a Loja Forma, Centro Cultural da FIESP, Museu da Língua Portuguesa, dentre tantos outros. Entretanto a obra escolhida foi a Praça do Patriarca, localizada no centro da cidade de São Paulo. A obra permite deslumbrar a completude do profissional como urbanista, crítico de arte e cientista social. E nessa alusão aos comentários de Edemar Cid Ferreira é possível acrescentar o poeta da cidade.
Dentre as obras de Mendes da Rocha o Pórtico do Patriarca foi escolhido pela possibilidade de integração do transeunte com a obra de arte. Sem contar com a perspectiva do arquiteto de pensar a obra de forma integrada e a valorização da possibilidade de socialização das pessoas em meio a uma praça. O arquiteto preservou características históricas, como a manutenção e recuperação do piso de mosaico português e demonstrou a preocupação com a conservação cultural daquele espaço, bem como com a sua integração com a proposta moderna.
É isso!!! A obra de Mendes da Rocha quando esmiuçada permite perceber mais que um simples monumento, mas uma escultura permeada de símbolos e significados.


3.1. Praça do Patriarca
Em meio à história quinhentista da cidade de São Paulo a Praça do Patriarca José Bonifácio de Andrada e Silva, é recente. A origem da praça se deu a partir da necessidade de abrir passagem para a Rua Líbero Badaró e para o Viaduto do Chá, em meados dos anos 1940 e 50.


FOTO 1. Praça do Patriarca em 1925, recém-inaugurada. A esquerda, o edifício da Mappin Stores.
FONTE: Prefeitura de São Paulo
FOTO 2. Praça do Patriarca anos 1930.
Fonte: Museu Virtual dos Transportes Urbanos

O crescimento e o dinamismo das cidades implicam em mudanças e adaptações do uso do espaço. Sendo assim revitalizações e intervenções se fazem necessárias para melhor utilização e otimização do espaço.
No caso da Praça do Patriarca não foi diferente, tornando-se necessária a sua revitalização. O projeto de revitalização da Praça era um sonho antigo, datado dos meados da década de 1990 e como parte de uma proposta mais ampla do Viva Centro para a revitalização do centro de São Paulo o projeto de Paulo Mendes da Rocha foi elaborado no ano de 1992, e executado em 2002, conforme consta no site da instituição.

3.2.A revitalização de um espaço público

A proposta explícita na memória descritiva do projeto contém características singulares do pensamento do arquiteto diante da necessidade de revitalizar um espaço público, bem como de não isolá-lo em meio ao contexto em que se insere. Para o arquiteto era necessário “Não simplesmente restaurar, também criar novos desenhos que abriguem, amparecem e expressem hábitos, símbolos urbanos contemporâneos, do tempo que vivemos.”
Aqui, na Praça do Patriarca, é indispensável a retirada dos ônibus e a partir daí, reformar o arranjo do espaço com atenção particular para os seguintes aspectos deste Projeto:
1 – Uma penetração do leito carroçável para breves estacionamentos, ponto de táxis, serviços da igreja e dos hotéis, para uso da própria Galeria Prestes Maia e ônibus turísticos ao longo da Líbero Badaró. Uma modalidade domesticada entre automóvel e pedestre. Que chegue um carro junto ao limite da Rua São Bento, boca da Rua da Quitanda, da Rua Direita, tradicional centro Bancário e Jurídico.
2 – Uma implantação intrigante, estratégica – ao longo do eixo do Viaduto – para o Ceschiatti Belíssimo com sua casaca barroca.
3 – Uma restauração oportuna dos desenhos nos mosaicos do piso, imperfeita...
4 – A substituição da Cobertura para o acesso da Galeria Prestes Maia. Que seria a peça mais importante do conjunto e que realiza a Praça.
Neste artefato arquitetônico deve-se tentar falar da contradição das escalas da “cidade velha” com a paisagem do Vale do Anhangabaú, principalmente em relação ao leito do Viaduto, uma extensão do mesmo piso da Praça no vazio, um passeio sob o amplo céu aberto.
Tanto para o abrigo das escadarias, com para o conjunto da situação toda, imaginamos uma cobertura suspensa, que não toca o chão, mostrando para o pedestre a pequena praça inteira e uma arquitrave que a sustenta pendurada, constituindo um portal para aquela parte da cidade, na qual se vai entrar. Por ali, n’aquele lugar. E, no sentido contrário, uma moldura de aviso para passar aos espaços abertos, para as visuais sobre o outro lado da cidade.
Esta estrutura se resolve com formas adequadas, leves e um tanto de aparência instável, convocando sensações imprevistas.
Estrutura metálica, de aço, de acordo com os desenhos, modelo, fotografias do modelo e cálculos estruturais preliminares que acompanham esta memória. De fácil execução com tecnologia perfeitamente dominada pela nossa engenharia. A cor deverá ser clara, branca*. O peso total do conjunto está estimado em 88 toneladas, muito cômoco.
5 – Iluminação nova, com refletores dirigidos para a Igreja e os edifícios restaurados. Uma iluminação própria da cobertura suspensa, irradiante da superfície branca, como o lugar.
(ROCHA, Paulo Mendes da. Memória descritiva do Projeto Patriarca)

A obra atendeu à proposta do arquiteto. E mais, manteve aspectos originais como a recuperação dos arabescos portugueses do piso.

FOTO 3. Croqui inicial da obra. (Elaborada pelo arquiteto)
FONTE: PINON, 2002.

FOTO 4. Localização da Praça no entorno.
FONTE: VILLAC, 2002.

3.3. Um novo elemento para a Praça

A construção do Pórtico branco, em meio à praça em estrutura metálica dá a ideia de mudança, de passagem do centro velho para o centro moderno de forma integrada. O Pórtico é formado por uma cobertura curva de 20 m x 25 m, uma viga triangular, com formato de estrela de três pontas, também tem função de calha. O vão do pórtico possui 40 m e está apoiado sobre dois pilares. As chapas de aço utilizadas para o recobrimento possuem 3 e 4,5 mm de espessura para a mesa superior e, 6 mm para a mesa inferior .
FOTO 5: Praça do Patriarca, São Paulo - SP

4. ANÁLISE ICONOGRÁFICA DA OBRA


PÓRTICO: “Varandas, pórticos e marquises se projetam a partir do volume principal de um edifício a fim de propiciar abrigo, receber e anunciar o ponto de entrada.” (CHING, 2005, p.247). Por meio do vazio central, o pórtico gera pontos de referência, entre o centro velho e o centro novo. Além de abarcar a referência simbólica impressa na concepção da praça como local de encontro entre transeuntes. A revitalização da Praça deu uma nova resignificação à utilização do local que havia perdido a essência de espaço público e de encontro.


BASES DE SUSTENTAÇÃO: Formadas por formas geométricas puras como a base triangular e os lados retangulares que dão origem ao sólido geométrico. Segundo Ching “O triângulo significa estabilidade”. (CHING, 2005, p. 40) A escultura tem duas bases verticais com design de um prisma com as extremidades em formato de triângulos. A base horizontal é feita por material maciço e de formas geométricas puras.


COBERTURA: A obra é leve, ágil, de forma sólida e com a transparência necessária para se ver através do tempo, para se ver o novo e o antigo justapostos. Mendes da Rocha revela com esta obra a sua preocupação com as funções do espaço da cidade dando espaço para a manifestação da luz natural.
A cobertura demonstra flexibilidade e de quebra a rigidez do material.


4.1. Conceitos Fortes

BRUTALISMO PAULISTA: A obra destaca as características brutalistas, uma vez que tem a estrutura aparente. Outra característica peculiar é a ausência de ornamentos e maiores rebuscamentos na elaboração do projeto.

LUDICIDADE: A projeção do espaço, da construção da obra tem em si a possibilidade de colocar o homem dentro da obra, de levá-lo para um espaço de transição, assim como é a vida.
LEVEZA: A aparência da obra permite o deslumbramento de leveza, a integração com o espaço circundante além de ser de uma materialidade “única” em meio aos projetos do arquiteto. A obra é leve, ágil, de forma sólida e com a transparência necessária para se ver através do tempo, para se ver o novo e o antigo justapostos. Mendes da Rocha revela com esta obra a sua preocupação com as funções do espaço da cidade dando espaço para a manifestação da luz natural.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto em sua totalidade tem impressa características do arquiteto, embora o material utilizado seja uma inovação do arquiteto. O Pórtico do Patriarca é objeto de integração para os transeuntes, bem como para a paisagem circundante.
É um espaço público que tem o intuito de integrar o centro novo e o centro antigo da cidade, de forma poética e artística. A forma do pórtico assim como os materiais e a cor branca, escolhida pelo arquiteto são sinônimos de aconchego e equilíbrio em meio a uma área urbana.
Mendes da Rocha, ao fazer o uso das formas primárias conseguiu um efeito lúdico, leve e mantendo a sua identidade por meio da estrutura aparente das chapas de metal sem maiores rebuscamentos. Demonstra compreender muito bem a necessidade dos transeuntes de um local de integração além de demonstrar uma sensibilidade exacerbada no que tange aos símbolos e significados.


5. REFERÊNCIAS

ARTIGAS, Rosa. (Org.) Paulo Mendes da Rocha. 2 ed. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
ASCHER, Nelson. Mendes da Rocha leva "Nobel da arquitetura". Folha de São Paulo. São Paulo, 10 abr. 2006. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1004200620.htm . Acesso em 31/10/2010.
CHING, Francis K. Arquitetura , forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
CONSTRUÇÃO METÁLICA. O belo do centro: Pórtico Praça do Patriarca – São Paulo/SP. Construção Metálica. Edição 96/ 2010 .
PINON, Hélio. Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Romano Guerra, 2002.

VILLAC, Maria Isabel. Um novo discurso para a megacidade: renovação urbana da praça do patriarca (1992-2002). Disponível em http://seu2007.saau.iscte.pt/Actas/Actas_SEU2007_files/Maria_Isabel_Villac_4.pdf. Acesso em: 10/1º/2010.


6. ANEXOS


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